terça-feira, 20 de novembro de 2012

Armadilhas e enganações

Este é o ponto: formal, formal! Eu acho que toda a função da educação institucionalizada é fornecer a você um certificado autorizado, oficial,
que você fez algum trabalho. Isso (para essa escola) desenvolve toda
sua sabedoria, toda sua personalidade. Nós estamos pensando que a
educação ainda está nas instituições. Mas as instituições estão
diminuindo cada vez mais para apenas aspectos legais, ou, dando as
pessoas credenciais oficiais.

Erving Goffman disse que existem duas diferentes artes: uma arte é
conhecida como fazer coisas, a outra arte, é convencer pessoas a serem
capazes de fazer. Elas são duas artes diferentes, pode-se ter uma arte e
não a outra. Pode-se ser um homem muito sábio, ser capaz de fazer as
coisas lindamente e ao mesmo tempo ser incapaz, inapto para persuadir
as outras pessoas que você é bom. Por outro lado, pode-se ser um
mestre em persuadir que você é bom e ao mesmo tempo ser um
ignorante em conhecimento real, em know-how. Portanto, falava
Goffman, a sociedade está constantemente sob a armadilha da
enganação.

As escolas que lhe dão o diploma, que lhe dão o certificado, são a
defesa da sociedade contra a enganação. Do contrario não se
distinguiria um doutor de verdade de um fingidor. Felizmente há uma
associação de diplomas que separa os doutores de verdade dos
enganadores. Esta é a única função da educação de fato!

Todos os multi bilionários, pessoas que criaram a Google, Apple,
Facebook, são todos desistentes da educação, nenhum deles tinha
diploma de universidade. É assim que funciona.

É uma má notícia para os acadêmicos, mas eu ainda não sei se é uma má notícia
para a sociedade. Não posso assegurar se é de uma maneira ou de outra,
eu ainda me debato com a questão. Nós estamos discutindo essas
questões. Eu não tenho certeza se é para melhor ou para pior.

Trecho de "Educação líquida ou sólida? Relações entre Bauman, Bourdieu e
Gramsci para uma análise crítica da Educação". Trabalho apresentado por João Nicodemos Martins Manfio na ANPOCS, em outubro deste ano.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Fernando Pessoa

 ‎"... é a loucura que dirige o mundo. Loucos são os heróis, loucos os santos, loucos os gênios, sem os quais a humanidade é uma mera espécie animal, cadáveres adiados que procriam" 

domingo, 6 de maio de 2012

Procurando pela brecha

Como o número de babacas é impressionante e o pessoal se esforça, sempre, pra tucanar a vida, topar uma vida digna é como jogar no campo do adversário.
"No campo do adversário é bom jogar com muita calma pra poder ganhar."
Agora, é preciso fazê muita mágica pra arrumá essa tal de calma.
Viva Gonzaguinha
Viva las chicas

Ditadura, vozes e paixão

Música, maestro!

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

O maior ladrão da história

Já se chega a um consenso no Rio; Sergio Cabral, querido governador do estado, alcançou com folgas a posição de maior ladrão da história política do país. Não se trata de um "rouba mas faz". É uma nova espécie de político, que se ancora na introdução de um estado, ainda que podre, onde antes não havia presença pública. Com isso, o Remelento de Cavalcanti (bairro do Rio onde o pústula foi criado e apelido devido na infância), capitaliza seu patrimônio político. A cortina de fumaça utilizada surte um efeito impressionante. Porém não se enganem. Breve veremos as mazelas do Rio voltarem a ser notícia. Pena que nessa hora o Cheirador de São Conrado já estará longe, aproveitando os vários milhões roubados do povo. Pena...

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

E quando há um colapso moral da sociedade...
"aqueles que estimam os valores e se matêm fiéis a normas e padrões morais não são confiáveis: sabemos agora que as normas e padrões morais podem ser mudados, e que tudo o que então restará é o mero hábito de se manter fiel a alguma coisa. Muito mais confiáveis serão os que duvidam e os céticos, não porque o ceticismo seja bom ou o duvidar, saudável, mas porque são usados para examinar as coisas e para tomar decisões. Os melhores de todos serão aqueles que têm apenas uma única certeza: independente dos fatos que aconteçam enquanto vivemos, estaremos condenados a viver conosco mesmos."

Hannah Arendt
Responsabilidade e Julgamento
1964
Ouço, leio, procuro uma saída.
O que fazer?
Perante os objetos dessas postagem?
Perante as desilusões com todas as tentativas abortadas de criar um Novo Mundo?
Vem de longe, no tempo, a vontade de transformar.
Utopias, com ou sem lugar. Depois, a distopia*.
Chega-me sempre a mesma resposta: observe, principalmente, você mesmo.
E, em segundo lugar, lembre que o mundo nunca foi bom. Era terrível na pré-história. Continua terrível, com ilhas de afortunados.
De quem é a culpa?
Para evitar uma linguagem religiosa: quem o faz assim?
Nós.
Manter um resquício que seja de uma postura machista, por exemplo, estimula casos como o da menina de 9 anos, grávida de gêmeos do padrasto, e ainda por cima, quase impedida de salvar sua vida, pelo aborto.
Acho, sinceramente, que o único mundo que podemos transformar, é o nosso interior. E já é uma tarefa hercúlea, que exige a coragem indizível de navegar por água bravias e desconhecidas. Nem todos conseguem.
Mas, caso consigamos, qual portos seguros frente às armadilhas da vida, iremos, sem esforço, transformando o mundo ao nosso redor.



*Distopia ou antiutopia é o pensamento, a filosofia ou o processo discursivo baseado numa ficção cujo valor representa a antítese da utopia ou promove a vivência em uma "utopia negativa". As distopias são geralmente caracterizadas pelo totalitarismo, autoritarismo, por opressivo controle da sociedade. Nelas, caem as cortinas, e a sociedade mostra-se corruptível; as normas criadas para o bem comum mostram-se flexíveis. A tecnologia é usada como ferramenta de controle, seja do Estado, seja de instituições ou mesmo de corporações. (Wikipedia)










segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Pra não dizer que não falei das flores


Houve um tempo em que a esquerda, afastada do poder, bradava palavras de ordem, criticava o "sistema", o "modus operandi" da política brasileira e mundial. A palavra da vez era ideologia.
Pecava, dizia-se, por teorizar demais, por estar afastada da prática política e social...

Tudo mudou.

O "sistema" deu guarida e aconchego aos barbudos e às senhoras de luta. A palavra de ordem passou a ser respeito. Respeito às classes esquecidas? Talvez. Mas respeito principalmente às instituições "democráticas", ao jeito brasileiro de se fazer política.

Fala-se da política como um ser dotado de personalidade própria. Uma velha senhora cheia de ideias formadas sobre tudo e sem a menor disposição para a mudança. Os transeuntes que lá estão não podem fazer nada que deixe a idosa de mau-humor... Respeita-se.

Num país com história política democrática tão recente é risível (ou seria deprimente) assistir aos já tão arraigados argumentos de que "política é assim mesmo"...

Falei em respeito, mas a palavra da vez bem podia ser pragmatismo.

A Maldição do Pragma


Repare que falando de roubo, exploração, dor, miséria, o pragma  deveria preceder o theoretikos. Se o objeto da esquerda é o combate às desigualdades, às injustiças sociais do dia-a-dia, aos instrumentos de dominação, é tiro no pé entreter-se no simbólico, na solução transcendental, no devir, no theoretikos. Isso é urgente, tá doendo, tem gente morrendo. Pragma! Se tiver que negociar, negocia, se tiver que radicalizar, radicaliza, se tiver que estudar, arriscar-se cada qual em sua medida, suportar asneiras, tudo isso tá na conta. Mas num fica de devaneio, num cruza os braços, num deixa de testar os limites. 
   
Tem besta na política não. Assim que o cheiro de poder invade o diretório do partido, vem essa coisa de respeitar limite prudencial, dançar conforme a música, abraçar o diabo. Apropriaram-se, distorceram cada síbala do pragmatismo. Formou-se a nuvem de mau agouro conformista. Já não se testam mais os limites, conviver com certas injustiças é mais cômodo que arriscar-se a perder o poder, e os avanços hão de haver num ritmo confortável à boa parte da elite. É a democracia, dizem. A racionalidade eleitoral é “pa-ra-g-má-ti-ca”, dizem, enquanto um pouco do que se espera é feito a conta-gotas.

Lá nos comitês dos barbados puros, onde há tempos a nada se cheira, é natural que se condene o termo apropriado. Mas tem besta na política não. Essa pureza transforma indignação em paralisia ou em texto cabeça, palavras de ordem datadas, frases de efeito. Difícil é criticar quem faz pouco sem fazer nada. Essa pureza, camarada, é amaldiçoada também, deixa você agressivo, mal humorado, orgulhoso de quê. Desperdiça paixão, e pior, mantém o status quo.  Deixa essa pureza pra lá camarada, deixa o rapaz comer no McDonald’s, fazer a barba, ouvir o hit do momento. Deixa a menina comprar os sapatos, alisar o cabelo, assistir à novela em paz. Isso não impede que ajudem, inclusive contra o conformismo. É preciso somar, e a pureza divide. O objeto não pode ser a crítica. É no fazer, e não no devir que se mudam as cousas. 

Mais futuro é descarregar o idealismo dando exemplo na luta da roça, na sala de aula, no parlamento, na reunião de trabalho. Juntando aliados, mesmo que impuros, incultos e inconsistentes para causas práticas, pontuais que fazem diferença. Militância tem que ser mais que uma tatuagem, um código de símbolos e gestos que identifica um membro como pertencente a um grupo. Sem efeito prático, é tão impactante quanto uma camisa de banda, um chapéu, um brinco. Alô! Não é pra abandonar os sonhos, tampouco é pra fugir do pragma. Antes libertá-lo, reintegrá-lo, ressignificá-lo,  e poder fazer do pragmatismo sem culpa.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Tenho a mesma sensação da Raquel Rolnik: em termos de direitos humanos. estamos andando prá trás - vide USP, Cracolândia e Pinheirinhos - 'pressionante!!!!!.
Repetindo: Deus não passou escritura prá ninguém, toda propriedade começou com uma ocupação, invasão da terra...
O grave é que estão todos cada vez mais "distraídos" por bugigangas eletrônicas, futebol, Big Bosta e carnaval, DH não é mais "pauta", o pensamento da direita avança, a serpente choca seu ovo...
"É hora!..."

Ação no Pinheirinho viola direitos, diz relatora da ONU

ELEONORA DE LUCENA
DE SÃO PAULO
O processo de reintegração de posse de Pinheirinho viola os direitos humanos. É preciso suspender o cerco policial e formar uma comissão independente para negociar uma solução para as famílias.
A opinião é da relatora especial da ONU para o direito à moradia adequada, a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, 55, que enviou um Apelo Urgente às autoridades brasileira pedindo explicações sobre o caso. Para ela, professora da FAU/USP, o país caminha para trás no campo dos direitos humanos e a pauta da inclusão social virou "sinônimo apenas da inclusão no mercado".
Nesta entrevista, ela avalia também o episódio da cracolândia. Faz críticas do ponto de vista dos direitos humanos e da concepção urbanística. Rolnik aponta para violações de direitos em obras da Copa e das Olimpíadas e avalia que "estamos indo para trás" em questões da cidadania.
No plano mais geral, entende que o desenvolvimento econômico brasileiro está acirrando os conflitos em torno da terra --nas cidades e nas zonas rurais. E defende que "as forças progressistas", que na sua visão abandonaram a pauta social, retomem "essa luta".
A seguir, a íntegra.
*
Folha - Qual sua avaliação sobre o caso Pinheirinho?
Raquel Rolnik - Como relatora enviei um Apelo Urgente às autoridades brasileiras, chamando atenção para as gravíssimas violações no campo dos direitos humanos que estão acontecendo no processo de reintegração de posse no Pinheirinho. Posso apontar várias dessas violações. Minha base legal é o direito à moradia adequada, que está estabelecido nos pactos e resoluções internacionais assinados pelo Brasil e que estão em plena vigência no país.
O grande pano de fundo é que não se remove pessoas de suas casas sem que uma alternativa de moradia adequada seja previamente equacionada, discutida em comum acordo com a comunidade envolvida. Não pode haver remoção sem que haja essa alternativa. Aqui se tem uma responsabilização muito grave do Judiciário, que não poderia ter emitido uma reintegração de posse sem ter procurado, junto às autoridades, verificar se as condições do direito à moradia adequada estavam dadas. E não estavam.
O Judiciário brasileiro, particularmente do Estado de São Paulo, não obedeceu à legislação internacional. A cena que vimos das pessoas impedidas de entrar nas suas casas e de pegar seus pertences antes que eles fossem removidos para outro local --isso também é uma clara violação. Isso não existe! Nenhuma remoção pode deixar a pessoa sem teto. Nenhuma remoção pode impor à pessoa uma condição pior do que onde ela estava. São duas coisas básicas.
Nenhuma remoção pode ser feita sem que a comunidade tenha sido informada e tenha participado de todo o processo de definição do dia da hora e da maneira como isso vai ser feito e do destino de cada uma das famílias.
Tudo isso foi violado. Já violado tudo isso, de acordo com a legislação da moradia adequada, tem que fazer a relação dos bens. Remoção só deve acontecer em último caso. Isso foi absolutamente falho.
Essa área não poderia ser decretada de importância social?
Não pode haver uso da violência nas remoções, especialmente com crianças, mulheres, idosos e pessoas com dificuldade de locomoção. Vimos cenas de bombas de gás lacrimogêneo sendo jogadas onde tinham mulheres com crianças e cadeirantes. Coisa absolutamente inadmissível.
Desde 2004 a ocupação existe e acompanhei como ex-secretária nacional dos programas urbanos do Ministério das Cidades. A comunidade está lutando pela urbanização e regularização desde 2004. Procuramos várias vezes o então prefeito de São José dos Campos para equacionar a regularização e urbanização.
O governo federal ofereceu recursos para urbanizar e para regularizar a questão fundiária. O governo federal não executa. O recurso é passado para municípios.
O que aconteceu?
Prefeito do PSDB jamais quis entrar em qualquer tipo de parceria com o governo federal para viabilizar a regularização e urbanização da área.
Por quê?
Pergunte para ele. Nunca quis tratar. A urbanização e regularização da área seria a melhor solução para o caso. A situação é precária do ponto de vista de infraestrutura, mas poderia ser corrigida. Aquela terra é da massa falida da Selecta, que é um grande devedor de recursos públicos, de IPTU. A negociação dessa área seria facilitada.
Se poderia estabelecer com eles uma dação em pagamento. Mesmo se não fosse viável uma dação em pagamento, a terra poderia ser desapropriada por interesse social, pelo município, Estado ou União.
Como fica a questão dos credores da massa falida?
Não sei quantos e quais são os credores. Recebi informações, que não sei se estão confirmadas, de que os maiores credores são os próprios poderes públicos, prefeitura municipal, Estado e governo federal, dívidas de INSS e impostos com o governo federal, principalmente dívidas com o município e governo federal. Não tenho certeza. Faz todo o sentido o equacionamento dessa terra para os poderes públicos e a posterior regularização fundiária para os moradores.
Como a sra. analisa a questão da disputa partidária no episódio, envolvendo PSDB, PT. O PSTU jogou para o confronto? Poderia ter solução sem confronto?
Não podemos ignorar que a questão partidária intervém nessa questão e em muitas outras. Há presença do conjunto dos partidos do país na disputa dos conflitos fundiários, assim como no investimento, regularização e urbanização dessas áreas. Existe a questão partidária e ela foi explorada nesse caso.
A questão fundiária do Brasil é politizada integralmente. Não só nesse caso. Há presença dos partidos também no momento que se muda o zoneamento da cidade para atender os anseios de determinados grupos imobiliários que vão doar para determinadas campanhas. Não tem processo decisório sobre a terra no Brasil que não esteja atravessado por questões econômicas e políticas.
Independentemente disso, atender plenamente aos direitos dos cidadãos tem que ser cobrado por nós, cidadãos brasileiros. Não quero saber se o PT, o PSDB, o PSTU estão querendo tirar dividendos disso. Como cidadã, isso não interessa. O que interessa é que o cidadão, as pessoas têm que ser tratadas como cidadãos, independentemente da sua renda, independente se são ocupantes formais ou informais da terra que ocupam, independentemente da sua condição de idade, gênero.
Não pode haver diferença e nesse caso houve claramente um tratamento discriminatório. E isso a lei brasileira impede que seja feito. Então há uma violação.
O PSTU jogou para o confronto?
Não tenho detalhes de como cada uma das lideranças agiu antes e durante a entrada da polícia. Se houve um líder que conclamou à violência, essa informação eu não tenho. É fato que a comunidade procurou resistir, porque acreditou que aquela liminar que suspendia a reintegração ainda estava válida. Por isso resistiu. Pode ter alguém conclamando à resistência ou não. Se a comunidade vai entrar nessa ou não, depende da própria avaliação que a comunidade faz: se ela tem chance de ficar ou não. A comunidade acreditou que a liminar estava suspensa e estava apostando em uma solução que estava em andamento.
Chamo atenção para a enorme irresponsabilidade do Judiciário nesse caso. Tínhamos uma situação de negociação em andamento. Sou contra [o confronto]. Sou absolutamente a favor de soluções pacíficas e, nesse caso, elas não foram esgotadas. Um contingente de 1.800 homens, helicópteros, usando elemento surpresa, uma linguagem de guerra.
Como avalia PT e PDSB nesse caso. A sra é do PT, não?
Não. Eu aqui falo como relatora dos direitos à moradia adequada. A questão partidária que existe é irrelevante. Os direitos dos cidadãos precisam ser respeitados.
O que se deve esperar como consequência concreta desse Apelo? A sra. acredita que possa haver reversão desse processo?
As autoridades têm 48 horas para responder ao Apelo. Confirmando ou não as informações de violação. Estamos alegando que houve informações sobre feridos, eventualmente mortes, que não houve. O Apelo é mandado para a missão permanente do Brasil em Genebra, que manda para o Ministério das Relações Exteriores e o MRE é quem faz o contato com a prefeitura, o governo do Estado e os órgãos do governo federal para responder.
Amanhã [hoje] faço um pronunciamento público. Nele peço que seja imediatamente suspenso o cerco policial, que se estabeleça uma comissão de negociação independente, com a participação da prefeitura, governo do Estado, governo federal e representação da própria comunidade, para que se possa encontrar uma solução negociada para o destino da área e das famílias. Que é a questão principal: o destino das famílias. Na minha opinião, idealmente, isso deveria envolver a própria área.
A sra. não descarta a hipótese das famílias voltarem para a mesma área?
Não descarto. Se houver um acordo em torno da questão da terra, inclusive com a massa falida da Selecta, seria possível. O mais importante: temos que acabar com esse tipo de procedimento nas reintegrações de posse no Brasil.
Não é só no Pinheirinho que estão acontecendo violações. Tenho denunciado como relatora que as remoções que estão acontecendo também violações no âmbito dos projetos de infraestrutura para a Copa e para as Olimpíadas. Menos dramáticas, talvez, do que no Pinheirinho, mas igualmente não obedecendo o que tem que ser obedecido.
A questão social no Brasil ainda é um caso de polícia?
Infelizmente tenho a sensação de que estamos indo para trás. Porque nós --e a minha geração fez parte disso-- lutamos pelo Estado democrático de direito, pela questão da igualdade do tratamento do cidadão, pela questão dos direitos humanos. Para nós, a partir da Constituição isso virou um valor fundamental.
Nesta mesma Constituição se reconheceu o direito dos ocupantes de terra com moradia, que ocuparam por não ter outra alternativa.
Está na Constituição e, agora que o Brasil está virando gente grande do ponto de vista econômico, estamos voltando para trás no que diz respeito a esses direitos. Estamos assistindo a remoções sendo feitas sem respeitar [esses direitos]. Estamos assistindo um discurso totalmente absurdo --de que eles, que ocupam áreas, que não tiveram outra alternativa, são invasores. Como eles não obedeceram a lei, não temos que obedecer lei nenhuma com eles.
É um discurso pré-Constituinte. Isso foi amplamente reconhecido na Constituição. Tem artigo sobre isso. Estamos tratando essas questões não só aí [no Pinheirinho]. Veja como isso está sendo tratado na cracolândia. Vemos isso em várias remoções nos casos da Copa e das Olimpíadas. Simplesmente há um discurso: eles são invasores, não obedeceram a lei, para eles não vale nada da lei. Estamos picando a Constituição.
Por que estamos indo para trás?
É preciso ver como se foi constituindo uma pauta dominante. Como a pauta da inclusão social acabou sendo sinônimo apenas da inclusão no mercado, via melhoria das condições de renda. A inclusão no campo cidadão acabou tendo um papel muito menor e menos importante.
Nesse momento de desenvolvimento econômico muito importante, as terras urbanas e rurais adquirem um enorme valor econômico. Os conflitos em torno da terra estão sendo acirrados em função disso, dado o enorme e importante valor que a terra está assumindo. A exacerbação dos conflitos de terra tem a ver com o aumento do interesse pela terra.
Qual sua visão sobre os incêndios em favelas em São Paulo?
Que favelas pegam fogo em São Paulo? As favelas melhor localizadas. Não vejo notícia de favela pegando fogo na extrema periferia na região metropolitana, que é onde mais tem favela.
Qual é a sua hipótese?
A hipótese tem a ver com a importância estratégica de uma parte da terra ocupada por favelas --a importância estratégica para o mercado imobiliário de uma parte da terra ocupada por favelas. Trata-se de uma espoliação: uma terra valiosa em que você tira a favela e pode atualizar o seu valor. Dentro de um modelo em que o único valor que importa é o valor econômico e os outros valores não importam, tirar essa terra valiosa de uma ocupação de baixa renda faz sentido.
Mas a terra tem outros valores. Por exemplo, a função social da terra, outra coisa que está escrita na nossa Constituição. Não estou afirmando que esses incêndios sejam criminosos, porque não tenho nenhuma prova, nenhuma referência que me permita dizer isso. Entretanto, acho fundamental que esses incêndios sejam investigados. Por que esses incêndios estão ocorrendo agora exatamente nessas favelas?
Como a sra. analisa a questão da Cracolândia?
Tem muito a ver com isso tudo, embora existam outros direitos humanos envolvidos. Estamos fazendo um Apelo Urgente também sobre a cracolândia, conjuntamente com o relator para direitos da saúde e com o relator sobre tratamento desumano e tortura. Devemos enviar brevemente.
Estamos numa situação em que um projeto urbanístico, que é o da Nova Luz, tem como principal instrumento a concessão dessa área integralmente para a iniciativa privada. A viabilização para a concessão dessa área é entregar essa área "limpinha". "Limpinha" significa sem nenhuma população vulnerável, marginal, ambígua sobre ela. E, no máximo possível, com imóveis demolidos, para permitir que se faça um desenvolvimento imobiliário com coeficiente de aproveitamento muito maior, prédios mais altos etc. E, portanto, com muito mais potencial de valor no mercado. Isso está diretamente relacionado ao modelo da concessão urbanística.
No plano urbanístico da Nova Luz, um dos principais princípios é liberar áreas dos imóveis e das pessoas que ocupam hoje, para permitir que essas áreas sejam incorporadas pelo mercado imobiliário com potenciais de aproveitamento maiores.
Tenho uma crítica do ponto de vista dos direitos humanos, da forma como tem sido feito. Como no caso do Pinheirinho: uso da violência policial e incapacidade de diálogo com a população. Mas também como urbanista tenho uma enorme crítica a esse plano da Nova Luz, que desrespeita o patrimônio material e imaterial ali presente. O bairro da Santa Ifigênia é o bairro mais antigo de São Paulo. É o único que ainda tem uma morfologia do século 18. Uma parte dos imóveis que está sendo demolida, supostamente interditada, deveria ser restaurada e reocupada. A ação é duplamente equivocada --do ponto de vista urbanístico e dos diretos humanos.
Como a sra. resume toda essa situação? É um processo de expulsão dos mais pobres?
Exatamente. Eu me recuso a chamar aquele local de cracolândia, porque foi um termo forjado pela Prefeitura de São Paulo. O fato de essa área estar ocupada por pessoas viciadas, que estão no limite da inumanidade, foi produto da ação da prefeitura, que entrou nessa área demolindo, largando a área, não cuidando da área, deixando acumular lixo e transformando essa área em terra de ninguém.
Isso é fruto da ação da prefeitura e não da falta de ação da prefeitura. Para depois chamar de cracolândia e depois constituir um motivo para entrar dentro dessa área derrubando tudo, prendendo todo mundo e limpando aquela área como terra arrasada para que uma ação no mercado imobiliário possa acontecer.
Qual é o panorama geral?
Estamos caminhando perigosamente no sentido da hegemonia do valor econômico da terra como único valor, desconstituindo avanços importantes que a sociedade brasileira fez no reconhecimento do direito de cidadania. Isso é muito perigoso para o país. Espero sinceramente que a partir da comoção do debate gerado sobre o Pinheirinho se possa reverter esse caminho.
A sra. está otimista?
O Brasil tem a faca e queijo na mão para poder mudar radicalmente de atitude. O Brasil tem recursos econômicos. Tem um ordenamento jurídico que permite respeitar os direitos.
O Judiciário tem que acordar para aplicar não apenas o direito de propriedade nos processos que envolvam conflitos de propriedade, mas também o resto do ordenamento jurídico que temos.
Os Executivos municipais, estaduais e federais também têm que rever a sua ação no sentido de obedecer isso. Temos recursos e temos uma base jurídica para poder recuperar esse caminho.
O modelo hoje beneficia os mais ricos?
É muito genérico falar dos mais ricos. É preciso ver quais são os interesses beneficiados e que não estão sendo beneficiados. Qual é a coalizão de interesses que está promovendo esse tipo de ação.
Temos que entender que sempre existiram forças conservadoras no país. Por que hoje elas têm mais força, mais poder? As forças progressistas abandonaram essa pauta e essa agenda e precisam retomá-las. Existem forças progressistas no Brasil.
Abandonaram a pauta social por quê?
Porque privilegiaram fundamentalmente a inclusão pelo consumo, o maior poder de compra, a valorização de salário, que são pautas fundamentais. Mas não pode ser só isso. Está na hora das forças progressistas retomarem essa luta.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Ouvi dizer que as coisas andam meio devagar na  Ésse Pê Ihhhhh, que fica na Hespla Nada dos Mini Stereos, situada em um lugar fictício, cheio de pessoas fictícias que fazem planos fictícios para um povo fictício.
Estranho lugar essa Hespla Nada. Cheio de coisas pra se fazer e o pessoal nada. Nada em mares de papéis, ofícios líquidos, ondas de notas técnicas, marés de pareceres e oceanos em formato a4. E daí........ nada.
Tem um barquinho tripulado por um tal de Marmota que tenta fazer alguma coisa. Aliados dele, Seu Demônio, Madame, Mad Dog Caruaru, Rose Lee e Bagual engrossam o coro dos que tentam mudar o cenário em Hespla Nada. Mas se a inércia de coisa já é coisa séria, imagina a inércia de Nada.


terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Estreia

"O grupo dominante coopta membros a partir de indícios mínimos de comportamento, como a boa conduta e a manutenção da ordem - entendidas como a arte de respeitar as regras do jogo até mesmo nas transgressões normatizadas pelas regras do jogo.

(....) O reprodutor oficial sabe produzir, no sentido etimológico do termo: producere significa "trazer ao dia", "conduzir à manifestação" - teatralizando o termo, trata-se de falar em nome de algo que ainda não existe (no sentido de não estar sensível ou visível). O reprodutor oficial deve produzir algo em nome daquilo que ele tem o direito de produzir. Ele não pode não teatralizar, não dar forma, não fazer milagres. O milagre mais ordinário, para um criador verbal, é o próprio milagre verbal, o êxito retórico; ele deve produzir o contexto que autoriza suas palavras, deve conformar a autoridade em nome da qual ele está autorizado a falar.

Encontrei a definição de "prosopopeia" que buscava agora a pouco: "figura de linguagem que atribui sentimentos e palavras humanas a animais, coisas personificadas, mortos ou ausentes". E no dicionário, instrumento sempre inspirador, encontramos esta frase de Baudelaire a respeito da poesia:"dominar sabiamente uma língua é praticar uma espécie de feitiço evocatório". Os clérigos - que manipulam uma linguagem erudita como os juristas e os poetas - devem colocar em cena o referente imaginário em nome do qual falam e produzem quando evocam discursos a partir de sua forma particular de linguagem; devem fazer existir aquilo que expressam e aquilo em nome do que expressam. Devem, ao mesmo tempo, produzir um discurso e uma convicção na universalidade desse discurso por meio da produção sensível, da evocação dos espíritos, fantasmas - o Estado é um fantasma... É dessa forma que "a nação", "os trabalhadores", "o povo", "o segredo de Estado", "a segurança nacional", "a demanda social" - "a qualidade do gasto" e "a gestão publica" (palavras nossas) - etc. são produzidos"

A fábrica da opinião pública. Pierre Bourdieu. Le monde diplomatique Brasil. Ano 5, nº54, pags. 14 e 15.

domingo, 22 de janeiro de 2012

A que venho

Saudações lerísticas!

Minhas contribuições vão ser, regra geral, o resultado do trabalho de garimpo, entre palavras alinhavadas maravilhosamente ou ideias geniais esboçadas, por outros. Pois a impressão que tenho, às vezes, é de que "tá tudo aí..."

Quanto a uma criação "minha", a coisa mais interessante que já me ocorreu, quando se trata de garantir o direito à terra, à moradia, regularizar a posse, trabalhinho legal que eu fazia vida afora, foi:
 - Deus não passou escritura para ninguém! - e nunca mais consegui algo do mesmo nível...

Mas parto do pressuposto de que, para transformarmos o mundo, temos primeiro de transformar em nós o que precisa ser transformado (se o quisermos). Para tal, conhecermos-nos é condição sine qua non... e como é raro!!... Pois olhar a própria cara no espelho é muito duro! Quando isso acontece, geralmente perdemos a razão... mas..


"...Bem vinda a debilidade mental que vos aproxima. Ela é legítima, mesmo tendo sido imposta. O cérebro louco recebe os infortúnios da vida e falta-lhe a razão para escondê-los. Não é casual a deficiência de honra ser a alma gêmea da lucidez em trajes impecáveis. Os risos nervosos da vossa abençoada demência serão os alucinógenos que embriagarão à morte a asquerosa sisudez dos normais. Saúdo a vós, malditamente insanos! Porque só a beleza do desatino é capaz de levar o homem ao estado de vergonha que a brutalidade natural do seu caráter renega." (Alex Nascimento)



Daí, preparem seus corações pra as coisas que vou catar e postar, pois venho lá do sertão, aprendi a dizer "não", e ainda viro esse mundo, em terra, trabalho e pão... 

"Não há que ser forte. Há que ser flexível." (Provérbio chinês)


"Aprendi a reconhecer o fato de que é a tua doença emocional que te destrói minuto a minuto, e não qualquer poder exterior.
Há muito que terias suprimido os tiranos se estivesses vivo e sadio no teu íntimo" W. Reich


"Lembra que o segredo da felicidade está na liberdade e o segredo da liberdade, na coragem" Tucídides




sábado, 21 de janeiro de 2012

Como Planejar com um Martelo



Degas - Não sei porque não faço poesias, tenho ideias tão belas.
Mallarmé - É que não se fazem poesias com ideias, fazem-se com palavras.

De um lado crenças, intuições, paixões; do outro evidências, lógica, razão. Os excessos destas coisas nos danam, e danados perdemos a razão e também a fé. Copérnico deve ter sofrido, penso que teve equilíbrio entre paixão e razão, mas deve ter sido uma vida difícil. Arrodeado de fanáticos em uma época difícil. Hoje o fanatismo está disfarçado,  comportado, de paletó e gravata, tailleur, toga ou bata. Cruzes e brasões ficaram um pouco de lado com a ascensão de três novos deuses: o direito, o mercado e a ciência. Pra ganhar o pão de cada dia, temos que nos ajoelhar e rezar pra estes três dementes horas a fio. E depois, danados até a medula, buscar um torpor que nos leve daqui. Puta que o pariu!


Meu filho, se você quiser adorar alguma coisa, coma esta coisa um pouco que seja. Não é só ler superficialmente ou assistir a um prostituto (sim, prostituto!) num cursinho de coffe-breaks não. Comer é pegar, tocar, sentir o cheiro, envolver-se, trocar fluidos, deixar correr nas veias. Quer defender a lei doutor? coma o tribunal, as partes, o lero jurídico na vida das pessoas. Quer defender a racionalidade do cacete a quatro, seu merda? Enfurne-se em um laboratório arrodeado de egos.phd e referências.sci e tente arrancar alguma verdade da natureza. O mercado, seu burguês de merda, vá no banco, na agência, nos donos do capital e tente sair de lá com um cuspe que seja sem usar seus contatos e sem dar toco com o dinheiro que herdou de papai. Meu filho, acorde!


Aí vem Dona Maria e diz que #$%*&¨%$#... planejamento de país. Ótimo, planejar é nosso negócio. A senhora gosta de planejamento mais, assim..., pro lado do mercado, ou pro lado da ciência? Bom, ofereci estes dois porque estou vendo que o planejamento legal já lhe foi servido, não é mesmo? Então vou lhe dar algumas opções: se a senhora gostar de um prato com sabores marcantes mas que não dá pra comer, porque não dá pra pegar, nem tocar, nem nada, sugiro um Plano de Desenvolvimento Nacional de longo prazo. Este prato é servido apenas em Estados, e não em Governos, porque no fundo, no fundo, trata-se de uma receita autoritária e muito apreciada em clima de golpe ou fortes ressentimentos.

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 Tudo bem, temos também um plano lógico, que é perfeitamente racional e fica lindo no prato, mas não sai de lá. Este prato serve-se em caixinhas e setinhas; o conhecimento, ou melhor, a pretensão do mundo todo fica dentro das caixinhas, e as setinhas são bem firmes, pode pôr a culpa nelas se precisar. Este prato agrada muito aqueles que se acham merecedores de alguma coisa, tem um buquê de meritocracia que é especialidade da casa.

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Ah, já entendi D. Maria, a senhora gosta mesmo é de pés. Pés é fantástico! Não importa se você é vermelhinha ou azulzinha, porque pés é moderno, é poético, é situacional, e aí você pode ficar de pés por vários mandatos. Assim, bom mesmo é se você fizer um pés com os pés no chão: a senhora conhece a real governabilidade das coisas? e a real capacidade?

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hummm... então vou lhe oferecer um bom pés com molhinho lógico. Porque se der merda a senhora usa as setinhas também, não é mesmo?

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A senhora tem um gosto tão diferente do Sr. Têcêú, este sim entende nossa gastronomia. Ah, Sr. Têcêú deixa as garçonetes daqui loucas, subindo pelas paredes com aquele perfume de acórdão, e sempre deixa um superávit de gorjeta. ... Falar nisso, será que rola um dezporcento no subsídio da carreira?

(...)

Que cara é essa D. Maria?

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Estamos cozinhando para servi-la, volte sempre!

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012